O tempo – nosso
bem mais
precioso e
efêmero – não
pode ser perdido
de forma tão
irracional em
engarrafamentos
e deslocamentos
desnecessários.
Assim, os
melhores
esforços e
conhecimentos
devem ser
colocados à
disposição da
melhoria da
mobilidade
urbana e do uso
do espaço urbano
em prol desse
precioso bem. A
partir desse
desafio, nos
debruçamos sobre
a seguinte
pergunta: um
sistema de
bilhetagem
eletrônica (SBE)
pode melhorar a
mobilidade?
Um SBE é
responsável por
processar os
pagamentos do
sistema de
transporte
público. Ele
engloba desde a
venda de
créditos ao
usuário,
passando pela
transmissão e o
processamento da
informação, até
a repartição dos
recursos aos
operadores. Os
dados gerados
pelo SBE são de
suma importância
para o cálculo
de uma tarifa
justa e o
planejamento dos
transportes.
Porém, há muitos
anos, os SBE de
municípios e
estados
brasileiros
enfrentam
questionamentos
de órgãos de
controle sobre
ausência de
transparência,
carência de
condições para
uma auditoria
confiável, falta
de
interoperabilidade,
falhas de
segurança dos
dados dos
usuários e
disponibilização
insuficiente de
dados ao poder
público. Esse
diagnóstico
indica
vulnerabilidade
e limitações ao
combate às
fraudes e à
correta gestão
financeira das
tarifas
arrecadadas nos
transportes.
Além disso,
sistemas de
bilhetagem podem
influenciar
outras políticas
de mobilidade.
Ao estudarmos
benchmarks,
observamos que
muitas cidades
no exterior
possuem
autoridades
metropolitanas
de transporte
como uma boa
prática a ser
seguida, como
nos casos de
Londres, Madri,
Hong Kong,
Lisboa e
Cingapura. No
Brasil, essa
situação se
inverte:
simplesmente
(ainda) não há
autoridade
metropolitana de
transporte tal
como nesses
outros locais.
Sem dúvida, o
vácuo de
governança
gerado pela
ausência de
autoridades
metropolitanas
de transporte no
Brasil resulta
em ineficiências
geradas pela
concorrência
predatória entre
os modos de
transporte, além
da subutilização
do benefício
potencial de
integrações
física e
tarifárias dos
modos. Esse
cenário muitas
vezes tem como
resultante um
transporte
público de baixa
qualidade, caro
e penoso,
especialmente
para as pessoas
de baixa renda,
que levam horas
para chegar nos
seus locais de
trabalho.
Nesse contexto,
é consenso que
um moderno SBE
metropolitano é
uma ferramenta
valiosa para as
autoridades
metropolitanas e
para o sucesso
da gestão da
mobilidade
urbana. Seja
pela
centralização da
arrecadação dos
transportes e
viabilização de
investimentos e
projetos
metropolitanos;
seja pela
disponibilização
de dados
confiáveis e em
tempo real para
melhor
planejamento das
frotas e
atendimento das
demandas dos
passageiros; ou
por otimizar o
potencial das
plataformas de
mobilidade como
serviço. Por
esses motivos,
um SBE
metropolitano
também pode ser
visto como uma
semente para
criação e
operação de uma
autoridade
metropolitana de
transporte.
Novamente, ao
observar
metrópoles
internacionais
como Cidade do
México, Lisboa,
Londres, Madri,
Hong Kong e
Cingapura,
destacamos que
muitas cidades
realizam uma
gestão pública
do SBE e,
portanto,
possuem um
controle mais
direto das bases
de dados e da
centralização da
arrecadação
financeira. No
Brasil, do mesmo
modo, a situação
se inverte. A
gestão dos SBE
nos aspectos de
controle das
informações e de
fluxos
financeiros é,
geralmente,
realizada por
operadores
privados. O SBE
de Curitiba é um
dos poucos casos
no Brasil com
gestão por
entidade
pública.
Além disso,
conforme citado,
os modelos de
SBE controlados
por operadores
privados no
Brasil enfrentam
críticas de
órgãos de
controle, em
relação à falta
de acesso das
autoridades e
sociedade civil
aos dados e
controles
financeiros.
Cabe destacar
que esses órgãos
de controle vêm
desempenhando
papel importante
para mobilizar a
atenção das
autoridades em
prol de
evoluções e
melhorias nos
modelos de
auditoria e de
governança dos
SBE brasileiros.
A partir desses
diagnósticos da
realidade dos
SBE no Brasil,
mostra-se
importante a
repactuação de
responsabilidades,
governanças,
modelos de
custeio e
mecanismos de
controle e
disponibilização
de informações
entre todos os
stakeholders. A
falta de
padronização
tecnológica e a
obsolescência de
tecnologias nos
SBE são
barreiras
técnicas para o
planejamento, a
integração e a
interoperabilidade
dos modos de
transporte. Além
disso, essas
questões
sujeitam os
sistemas à
possibilidade de
fraude
operacional e
tecnológica.
Além do mais,
podemos observar
que a cada dia
fica mais
notória no
debate público a
importância de
tarifas com
preços
acessíveis como
alavanca de
inclusão social.
Mais de 50
cidades
brasileiras já
praticam tarifa
zero e São
Paulo, maior
metrópole da
América, iniciou
estudos para
avaliar a
viabilidade da
medida. Os
benefícios
gerados pela
proposta, que
permite a
ampliação do
acesso ao
transporte,
combate à
exclusão social
e dinamiza a
economia local,
vão além, pois
contribuem para
redução do
trânsito, dos
acidentes, da
poluição e das
emissões que
aceleram as
mudanças do
clima.
Mesmo sem tarifa
zero, as tarifas
pagas pelos
usuários
normalmente são
insuficientes
para custear um
transporte
público de
qualidade. Em
Paris e Londres
as tarifas pagas
pelos cidadãos
equivalem a
cerca de 30% e
50% do custo de
operação,
respectivamente.
O restante é
formado por um
conjunto de
receitas como as
provenientes de
subsídio
estatal.
Portugal criou
um programa de
apoio à redução
tarifária,
apoiado com
recursos
oriundos dos
combustíveis
poluentes. Ela
ainda pode
exigir a adoção
de boas práticas
de mobilidade e
contrapartidas
dos atores
locais.
Nesse contexto,
a confiança
gerada por um
SBE pode
contribuir para
oferecer
segurança
jurídica aos
tomadores de
decisão para
viabilizar o
aporte de
subsídios no
transporte
público e a
justa
remuneração dos
operadores. Tal
iniciativa
melhora o
ambiente de
negócios com
garantias,
estabilidade e
previsibilidade,
atraindo novos
investimentos e
atores do
mercado, tanto
para investir na
infraestrutura,
quanto para
operar os modos
de transportes
com mais
qualidade. A
melhoria da
mobilidade
urbana deve
buscar todas as
alavancas de
valor possíveis
e, sem dúvida,
um SBE confiável
e moderno é base
para esses
avanços.
Portanto, o SBE
é uma ferramenta
chave para a
melhora do
transporte
público e para
evitar o
desperdício
irracional do
nosso apreciado
tempo. Esse é o
caminho da
gestão pública
com
transparência,
que transforma
um cenário de
conflito e
desconfiança do
setor de
transportes em
cooperação e
relações de
ganha-ganha para
toda a
sociedade. Como
bem alertou
Saint-Exupéry, o
futuro não é um
lugar para onde
estamos indo,
mas um lugar que
estamos
construindo e um
SBE pode ser
entendido como
um dos pilares
básicos ou a
porta de entrada
para a
construção
bem-sucedida de
uma série de
outras
estratégias de
melhoria da
mobilidade
urbana, com
benefícios na
qualidade de
vida das pessoas
e para o meio
ambiente.
(*) A opinião do
autor não
reflete
necessariamente
as opiniões do
BNDES.