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Caixa-preta e outros falsos problemas

VÍNCULO 1329 – Existe uma crise estrutural do nosso país. Dos anos 1950 ao final dos 70, o Brasil foi uma economia extremamente dinâmica. O falecido Antônio Barros de Castro, tendo como base esse período, fazia referência a uma “convenção do crescimento” – uma expectativa generalizada de parte dos agentes econômicos de que a economia brasileira poderia sofrer aqui e ali alguma crise, mas tenderia a retomar seu ritmo normal de alto crescimento.

Nos últimos 30 anos, passamos dessa condição para a de uma economia cuja falta de dinamismo chega a ser motivo de piada. O contraste com o conjunto, cada vez mais ampliado, de países dinâmicos na Ásia torna nossa situação particularmente vexatória. E não estamos sozinhos. A América Latina não oferece modelos, mas uma espécie de mediocridade, nesse ou naquele aspecto, superior. Não é o México, nem o Chile, nem os países bolivarianos que podem inspirar um caminho alternativo.

Somada à crise estrutural, vivemos a maior crise conjuntural da nossa história. Da “nova matriz econômica”, enveredamos em políticas de austeridade cada vez mais “machonas”. O fracasso de cada política de austeridade em entregar os objetivos prometidos, sendo explicado pela falta de um compromisso verdadeiramente draconiano. Assim, a partir de 2015 abandonamos o “pragmatismo” do período petista (uma combinação de falta de qualquer reflexão teórica, ou adesão a princípios, com a adoção e repetição de qualquer crença que parecesse conveniente a burocratas, para subirem nas suas carreiras, e a políticos, para ganhar eleição – ou seja: oportunismo travestido de pragmatismo) e fomos afundando em formas cada vez mais extremadas de fundamentalismo liberal, até chegarmos à versão “chicago oldies” oferecida pelo novo governo.

Então, da crise gerada por uma atuação que desperdiçou o período das “vacas gordas” para direcionar o país numa retomada do desenvolvimento de longo prazo, caímos numa ressaca ultraliberal que quer expiar os pecados do período passado pela adesão às formas mais extremas de liberalismo, não obstante o declínio de sua reputação nos últimos 20 anos, intensificado pela crise de 2008.

Resultado: do desapontamento com a relativa falta de efetividade da atuação estatal desorganizada, concluímos que o problema foi a atuação em si. Nosso problema não foi a ação específica que o Estado escolheu, mas a própria ação ou sua escala.

As razões utilizadas vão do moralismo, que tem no juiz-ministro Sérgio Moro um símbolo, ao ultraliberalismo à la superministro Paulo Guedes, para ficar no que o novo governo, digamos, tem de melhor a oferecer. É claro que aqui nunca nos ocuparemos do que for expresso em grego e tupi-guarani. O resultado que se conclui pelos dois caminhos é a intrínseca tendência à corrupção da ação estatal. Nas palavras do ministro da Economia, a intervenção estatal corrompeu o país; no que se pode inferir da vertente moralista, toda ação estatal foi motivada por intenções corruptas – meros pretextos. JBS, as construtoras, o financiamento de obras no exterior, usinas de etanol, os investimentos da Petrobras etc., aparentemente, todos devem morrer ou não importa se morrerão, porque foram meros atalhos para a corrupção.

O problema é geral, abarca todo o Estado brasileiro, mas é interessante que o BNDES tenha virado, mais do que qualquer outra instituição pública, o símbolo do liberal-puritanismo da nossa era. A “caixa-preta” do BNDES tornando-se símbolo da crítica liberal conservadora; o “kit-gay” de tal discurso na esfera econômica.

Diante dessas forças históricas, o que pode fazer o conjunto dos funcionários do BNDES? Podemos oferecer duas coisas: compromisso com a instituição e ideias. O compromisso deve estar fundamentado no entendimento de que a defesa do BNDES é a defesa da pátria (para adotar a dicotomia, entre patriotismo e nacionalismo, proposta por João Moreira Salles em artigo na revista Piauí de dezembro último). Tem que ser expresso na inflexibilidade de princípios, em dizer publicamente e dentro do espaço do BNDES o que é bom para a instituição e para o país. Não importando a que custo na carreira. Será que o BNDES pode inspirar esse tipo de compromisso?

Sobre as ideias, a AFBNDES tem exposto algumas nas páginas do VÍNCULO e em alguns seminários. É interessante ver que um número crescente de funcionários tem encontrado no nosso jornal um valioso canal de expressão. Ele está aberto a todos. Temos orgulho, em particular, dos artigos que optam por uma abordagem francamente crítica, como um convite ao debate. E queremos ir além em parceria com o corpo técnico. Temos convicção de que, deixando para trás o besteirol da “caixa-preta”, aceitando que o problema do BNDES é de “política” (pública) e não de “polícia”, há muito o que criticar, discutir e esclarecer.

Que sucesso podemos esperar dessa empreitada? Voltando ao artigo do João Salles, concluímos, como ele, citando o poeta T. S. Eliot: “Tentar é o que nos sobra”, “O resto já não é conosco”. Que ninguém duvide, a AFBNDES vai tentar. Em tempo: ainda estamos esperando o encontro com o presidente Joaquim Levy.

Associação dos
Funcionários do BNDES

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