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Compliance strikes back?

VÍNCULO 1337 – Nas duas últimas semanas, o presidente do BNDES, Joaquim Levy, comunicou, via imprensa, a decisão de que os apoios à exportação de bens e serviços não mais existirão. Seria um eufemismo dizer que o motivo apresentado é que esses projetos não são meritórios. A expressão usada pelo presidente foi muito mais forte do que isso. Tais operações seriam um “desastre”, resultado de “projetos inadequados”, politicamente motivados. Melhor citar a própria sentença utilizada por Levy na entrevista ao Estadão em 20 de março último:

“Acabou a política de emprestar para governos estrangeiros. Foram feitos empréstimos por motivação política e que hoje não estão sendo pagos”.

Na GloboNews, na semana anterior, a decisão parecia que estava em elaboração. Perguntado sobre o estado e a situação financeira dos financiamentos do BNDES a projetos no exterior, a resposta foi igualmente generalizante: “Esses projetos continuam gerando muito desconforto”. Segundo Levy, por duas razões. Em primeiro lugar, não alcançaram os objetivos que diziam que iriam alcançar, as infraestruturas teriam virado “elefantes brancos” nos países onde foram estabelecidas. Em segundo lugar, estão inadimplentes. Importante destacar que Levy reconhece que para o BNDES não houve problema, uma vez que os financiamentos contaram com seguro do governo – na verdade trata-se de um fundo governamental, o Fundo de Garantia à Exportação (FGE). Se o BNDES não teve problemas, o mesmo não poderia ser dito sobre as finanças públicas, uma vez que sobre elas recaiu o peso da inadimplência.

Os técnicos do BNDES podem acompanhar essas declarações de forma neutra? Como se deve avaliar o sucesso ou o fracasso de um conjunto de operações realizadas em mais de 20 anos? Como devemos avaliar o sucesso ou o fracasso de um mecanismo de seguro? Como devemos avaliar o impacto das inadimplências recentes sobre as finanças públicas e sobre o bolso do contribuinte?

Começando pelo segundo ponto levantado por Levy: a questão da inadimplência das operações.

O índice de inadimplência das operações é baixo. Especificamente sobre as operações de exportação de bens e serviços, em U$10 bilhões ao longo de 20 anos, temos um índice que não chega a 5%. De forma mais geral, o Relatório do FGE está disponível na internet e mostra que, desde que foi criado, o fundo acumulou um ativo de R$ 35 bilhões, por meio do acúmulo de prêmios (pagamentos dos segurados) e rendimentos. Devido à baixa inadimplência, o patrimônio líquido, em dezembro de 2018, era de mais de R$ 30 bilhões. Em 2018, apesar do pagamento de indenizações (R$ 1,35 bilhão), o lucro líquido do FGE foi de R$ 1,85 bilhão.

Se esse é o desempenho das operações e do FGE, não nos parece correto dizer que o contribuinte está pagando a conta; qual conta? – ao menos se analisarmos o conjunto das operações ao longo do tempo, único contexto válido para fazer um julgamento peremptório.

Voltemos para a primeira crítica de Levy, sobre as características dos projetos que foram apoiados. É justo dizer que são “elefantes brancos” ou, alternativamente, obras malfeitas etc.? Ao longo desses anos, o BNDES apoiou obras em países em desenvolvimento, algumas vezes obras decisivas para esses países. Muitos dos países apoiados possuem laços de proximidade culturais e históricos com o Brasil. Não temos razão nenhuma para ter vergonha das obras que apoiamos. Qualquer balanço sobre o conjunto das obras mostrará que além das vantagens econômicas que nos trouxeram, geração de emprego e renda no país e ingressos de divisas, esses empreendimentos ajudaram a consolidar a reputação da engenharia brasileira fora do país. Se essa é uma questão, façamos esse balanço. Façamos uma análise das obras apoiadas. Uma sugestão para o presidente.

Mas vão dizer, como sempre se diz, por que fazer o porto em Cuba (ou em qualquer outro país) e não no Brasil? Uma resposta simples seria perguntar de volta: qual foi o porto que deixou de ser feito no Brasil por conta do porto em Cuba? A linha de financiamento à exportação de serviços utilizou cerca de 1,5% dos recursos emprestados pelo BNDES. Note-se que a mesma pergunta deveria ser feita para qualquer item exportado pelo Brasil. Falta avião no Brasil, porque exportamos avião?

A estratégia argumentativa de pegar três casos recentes em que há problemas e generalizar para todas as operações com o objetivo de estigmatizá-las não sobrevive nem mesmo ao exame superficial desenvolvido aqui. Claro que os três casos mereceriam discussão específica.

Finalmente, é curioso que o presidente tenha invocado “motivações políticas” para explicar as operações de comércio exterior. Deveríamos nos perguntar se no comércio exterior elas não devem existir. Ou em que grau devem existir. No nosso entender, uma coisa é certa: preocupação técnica sempre precisa se fazer presente.

Avanço:

Enquanto fechávamos esta edição, o presidente Levy declarou à imprensa que: “Os empréstimos foram uma política de governo em certo momento. Responderam às prioridades de governo naquela época”.

E ainda, questionado se os atrasos por parte de Venezuela e Cuba sinalizam que os empréstimos foram mal avaliados, ele respondeu: “É uma oportunidade de se debater se aquela prioridade do governo era a mais adequada”.

O presidente Levy encaminha a questão da forma como acreditamos que deva ser feita. As críticas sobre as operações do BNDES não devem ser tratadas como caso de polícia, mas de política pública. Façamos, então, o debate sobre a política pública de exportação. É dele que o país precisa.

Associação dos
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