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As cinco metas de Montezano

VÍNCULO 1354 – A AFBNDES e as demais Associações do Sistema BNDES participaram de uma reunião com o novo presidentedo Banco, Gustavo Montezano, na última quinta-feira. O presidente foi educado, direto e argumentativo. São importantes características para um presidente do BNDES, particularmente para quem pretende com ele manter diálogo.

O novo presidente conseguiu apresentar um programa para o Banco resumido em cinco metas. São elas: 1.explicar a “caixa-preta” do BNDES; 2. vender a carteira de ações da BNDESPar; 3. devolver R$ 126 bilhões de aportes do Tesouro; 4. apresentar um plano trienal, que envolve o “redimensionamento” do Banco; e 5. avançar num modelo do BNDES baseado na prestação de serviços.

Claro que suas metas são ainda vagas. O quão são vagas é difícil de determinar, mas são claramente vagas. São alinhadas, segundo suas próprias palavras, com as determinações do Ministério da Economia. A contribuição pessoal do novo presidente, pelo que percebemos, estará em buscar alternativas para tratar da questão da suposta “caixa-preta” e nos dois últimos pontos: o plano trienal e a prestação de serviços.

Seus cinco pontos são sua resposta ao desafio de assumir o cargo de presidente do BNDES, acenar algum gesto de segurança para o corpo técnico da Casa e, ao mesmo tempo, atender às demandas de um governo abertamente hostil à instituição.

Quando falam em abrir a “caixa-preta” do Banco, obviamente, querem a confirmação de supostos descalabros na atuação do BNDES. Vejamos o caso do apoio ao comércio exterior.

Alguém pode perguntar: mas não é uma vergonha para o BNDES que estejamos sofrendo “calote” de Cuba e Venezuela (apesar de Angola ser sempre citada, não há default do país até o momento)? A resposta é que é tão vergonha quanto qualquer outro calote, mas (a realidade se impõe) eles são inevitáveis. Em retrospecto, fica fácil detectar erros. Sem considerar que o apoio do Banco foi garantido pelo Fundo de Apoio à Exportação (FGE), que qualquer governo legítimo tem o direito de propor uma política externa, que se a política externa petista foi controversa, ela nunca foi absurda (seguia orientações contidas na própria Constituição), que o FGE é um fundo saudável que por 19 anos nunca sofreu um default sequer por conta do apoio à exportação de bens e serviços de engenharia, que fundos governamentais de garantia ao comércio exterior cobrem exatamente operações voltadas para países com maior dificuldade de acesso ao crédito, ou seja, mais arriscados, que as obras financiadas pelo BNDES estão de pé e ajudaram vários países com os quais o Brasil mantém relações históricas, que a Odebrecht corrompeu, e muito, como indica uma série de delações, mas era uma empresa de reputação internacional e que teve vários outros financiadores (nos últimos 10 anos os desembolsos do BNDES corresponderam apenas a 10% da receita internacional da empresa).

Não há mea-culpa a ser feita pelo BNDES. Nem cabe ao BNDES fazer isso. O que caberia ser feito era uma discussão sobre que procedimentos novos poderiam ser adotados para evitar que esses problemas (corrupção de empresas apoiadas pelo BNDES) ocorressem. Se o foco fosse esse, a discussão seria mais promissora que a atual tentativa de encontrar má-fé no trabalho já executado pelo BNDES, apesar da total falta de evidência de que isso tenha ocorrido após uma série de apurações internas, CPIs, auditorias etc.

O BNDES não tem um “problema de transparência” se é o que se pretende aludir com o termo “caixa-preta”. Isso não quer dizer que o Banco não possa ser mais transparente, mas o fato é que o BNDES se destaca relativamente, no Brasil e no mundo, por ser transparente. Essa é a única coisa que pode ser dita de forma séria. E a verdade tem que ser dita. Sim, o discurso feito na campanha eleitoral e nas lives é leviano, para insistir em eufemismos.

Há avanços claros na percepção da opinião pública esclarecida sobre a situação do BNDES em termos de transparência. Temos que persistir nesse caminho. Hoje o principal propagador de notícias falsas sobre o BNDES é o próprio governo federal. E é tão provável que haja recuo nesse tema, como haja recuo no tema do kit gay etc. O que podemos esperar é que esse discurso perca a credibilidade junto à opinião pública mais esclarecida e que com o tempo o presidente e seus filhos encontrem outros inimigos para animar sua base eleitoral.

Não faz sentido uma reviravolta no tratamento do tema. A maior contribuição que o novo presidente poderia dar a esse debate é se ater aos fatos e afirmar o que fizeram TODOS os seus antecessores desde o fim do governo do PT (estamos falando de quatro ex-presidentes): afirmar que é nonsense a referência à “caixa-preta”. Quem sabe a confiança de que goza junto ao presidente da república possa fazer diferença.

Sobre a venda da carteira da BNDESPar, o presidente tem feito o discurso de que o Banco não deve manter aplicações “especulativas” (sua referência à carteira detida pelo Banco). A BNDESPar há 40 anos tem se mantido estável e lucrativa. A venda de ações vem ocorrendo e é difícil discordar do ex-presidente Levy quando diz que a venda deve continuar a ser feita respeitando parâmetros técnicos. Não está claro ainda como o novo presidente pretende atender a demanda de Brasília para uma venda acelerada da carteira sem desrespeitar esses parâmetros.

Sobre a devolução dos R$ 126 bilhões de aporte do Tesouro, argumentamos com o presidente que as devoluções em si são ilegais, pois ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ele ouviu atentamente o nosso argumento. Explicamos ainda que a devolução acelerada desses recursos leva à violação adicional de outras leis. Montezano se deparará aqui com os mesmos problemas dos últimos cinco ex-presidentes (sim, as devoluções começaram com Luciano Coutinho).

Sobre o redimensionamento do Banco não há nada definido ainda segundo o presidente. É claro que a sinalização é de uma redução progressiva do Banco e de seu quadro funcional, enquanto ele se adapta ao seu novo papel de Banco de serviços. Argumentamos com o presidente que uma atuação do BNDES como fornecedor de inteligência para o governo e empresas é altamente desejável e teríamos nisso muito acordo com ele. Por outro lado, o conhecimento do Banco depende de sua atuação como financiador. Não se trata de reduzir um papel em detrimento do outro, mas desenvolver mais um dos papéis.

A adesão a essas propostas são reveladoras de que o presidente compartilha do diagnóstico sobre a economia brasileira e o BNDES dos ultraliberais do Ministério da Economia. As ilusões nesse terreno de todo esse grupo são de tamanha dimensão que estão fadadas a não sobreviverem ao confronto com a realidade nos próximos meses. A opinião entre economistas, mesmos alguns dos mais adeptos do credo liberal, tem sofrido inflexão. Estamos, é claro, sendo pilotados pela vertente mais extrema e mais vinculada aos interesses do mercado financeiro. Serão os últimos a se renderem aos fatos.

A realidade é que há amplo espaço para o setor privado financeiro no Brasil contribuir para atividades produtivas. Se esse não cresceu, se deve nada ao BNDES, e muito à existência de alternativas mais seguras e lucrativas de aplicação. Essa foi a estratégia dominante. O mecanismo responsável por isso, como já descobriu um dos maiores defensores da ortodoxia econômica brasileira, Andre Lara Resende, tem a ver com as altíssimas e despropositadas taxas de juros brasileiras, decorrentes do conservadorismo (até que ponto desinteressado não se sabe) dos que comandaram o Banco Central. A realidade é que hoje, mesmo retirando o subsídio do BNDES e o concedendo ao setor privado (debêntures incentivadas), não assistimos a uma retomada do financiamento em infraestrutura.

A confiança exagerada em recursos externos que entrariam no país após a aprovação da reforma da Previdência, é outra ilusão perigosa que menospreza os riscos cambiais associados a essa entrada de recursos.

É lastimável constatar que tínhamos tudo pronto para iniciar a recuperação da economia. Capacidade ociosa, recursos mobilizados num banco de desenvolvimento, amplo colchão de proteção cambial. Ao invés de empregar essas ferramentas em prol de um arranque, a opção é por um autoflagelo sem fim com ameaças concretas de destruição institucional.

A tragédia brasileira continuará. Aos benedenses cabe defender o Banco. Dias melhores virão. A tarefa fundamental hoje é resistir, expor as tolices. Não é momento para alimentar ilusões baseadas em óbvios interesses oportunistas e carreiristas.

Associação dos
Funcionários do BNDES

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