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Complexidade Econômica e a Política de Conteúdo Local do Petróleo no Brasil

Bruno Plattek de Araújo – Engenheiro convidado pela AFBNDES para falar sobre Políticas Públicas de Conteúdo Local nos setores de Petróleo e Gás Natural em seminário promovido pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado no Clube de Engenharia, em 22/09/2017

Vínculo 1267 – A interessante abordagem da Complexidade Econômica vem ocupando um importante espaço nas rodas mais diletas do mundo acadêmico e, talvez pela sua simplicidade e beleza, conseguindo alguma divulgação junto ao grande público.

Esse campo fértil e recente da pesquisa econômica que usa a teoria de redes e congrega físicos, economistas, engenheiros, cientistas sociais e da computação, é muito bem-vindo por nos lembrar algo que já deveríamos estar carecas de saber, mas que, de tempos em tempos, insistimos em duvidar: a estrutura produtiva importa para o desenvolvimento econômico e social.

Mas porque escrevo sobre Complexidade Econômica se o convite que me foi feito para ocupar esse espaço era para falar do setor de Petróleo e Gás Natural (P&G) e de sua Política de Conteúdo Local? Por um simples motivo: o setor de P&G representa de longe a maior oportunidade para o desenvolvimento da estrutura produtiva do país nas próximas décadas.

As melhores fontes de informação que podemos ter hoje sobre o assunto, mesmo que divirjam em algum grau, não deixam a menor dúvida: o arraste que o setor de P&G possui nas diversas cadeias de fornecedores e na estrutura produtiva local é colossal.

Apresento alguns números, sem a pretensão de ser preciso, mas com o simples intuito de dar a ordem da grandeza do que estamos falando. O setor representa hoje entre 150 a 200 mil empregos industriais e envolve mais de 10 mil empresas na sua cadeia produtiva. São mais de R$ 60 bilhões em investimento anual (mesmo após tremenda redução do plano de investimentos da Petrobras) – o maior volume em um único setor industrial no Brasil. O setor é também o principal demandante da indústria de transformação. A Petrobras até há bem pouco tempo era a empresa com o maior plano de investimentos do mundo, e os investimentos das demais operadoras, se ainda pequenos, crescerão.

O setor é um dos principais demandantes de novas tecnologias e contribui de forma significativa para os investimentos em PD&I no país. Ao contrário do que acostumamos ouvir de que este seria um setor de tecnologia madura, o Pré-sal representa uma completa mudança de paradigma para a atividade de Exploração e Produção (E&P) offshore, sobretudo do ponto de vista da inovação.

Serão novos processos e equipamentos mais compactos e que passarão a operar não mais nas imensas plantas de processo das plataformas, mas no leito submarino em lâminas d’água de 2 mil metros. As tecnologias de perfuração deverão atingir até 7 mil metros, atravessando uma camada de sal de mais de 2 mil metros de extensão. A formação geológica absolutamente heterogênea e única no mundo demandará intensa pesquisa de novos materiais e processos para essa atividade. A alta concentração de contaminantes no óleo necessita de novas soluções de revestimento. As enormes distâncias da costa implicarão maior inteligência logística e novas formas de transportar o óleo produzido até o continente. As operações das plantas submarinas necessitarão de novas formas de geração e transmissão de energia, em novos conceitos como o de smart grid subsea.

Há muitos outros exemplos que poderiam ser citados. As bases de conhecimento relacionadas são diversas – da nano à biotecnologia, das tecnologias de informação e comunicação às novas gerações da eletrônica e da elétrica aplicada, além da ciência dos materiais, passando pela química e pela atividade de engenharia de projetos, dentre tantas outras. Por diversos ângulos, as oportunidades para o desenvolvimento de novas tecnologias são imensas e puxarão o conhecimento e o progresso técnico em diversas indústrias, no Brasil ou no exterior.

Ao me alongar nessas tecnicalidades, o leitor deve estar se perguntando: o que a Política de Conteúdo Local tem a ver com essa história? Eu diria tudo. O desenvolvimento e a inovação não ocorrem espontaneamente, em especial nesse setor. Mais do que isso. Políticas públicas pelo lado da oferta não são suficientes para o adensamento da cadeia produtiva de P&G. Explico.

A continuidade e a previsibilidade da demanda são fundamentais para a decisão de investimento produtivo em qualquer setor – no setor de P&G esse é um aspecto extremamente crítico. As elevadíssimas barreiras à entrada, os imensos riscos envolvidos, a elevada concentração na maioria dos segmentos da cadeia produtiva e o predomínio de estratégias ancoradas no domínio tecnológico nesses segmentos criam uma dinâmica onde novos investimentos dependam, necessariamente, de cenários que reduzam significativamente as incertezas quanto à demanda e que viabilizem a realização de compromissos de longo prazo no setor produtivo.

Assim, a principal função da Política de Conteúdo Local no Brasil é a de direcionar uma demanda contínua, previsível, sustentável e em volumes que incentivem novos investimentos no país e a cooperação na cadeia produtiva, sem os quais não se viabiliza o adensamento produtivo local.

Caro leitor, este é tudo menos um setor onde a concorrência seja perfeita. Em setores com essas características e de forma a incentivar o investimento e a inovação, diversos países usam e abusam de mecanismos para direcionar a demanda às suas bases produtivas – a forma com que o fazem é que se distingue. Nos EUA, pelas compras diretas do setor público ou pela regulamentação; na Noruega, pelo poder de compra de sua estatal e pelo fomento às firmas de engenharia locais; na Indonésia, por políticas que incentivam e condicionam a formação de parcerias. Na Arábia Saudita, Angola, Nigéria, Canadá, os exemplos são inúmeros, as formas diversas, mas há em comum justamente o desenho de mecanismos que permitam às bases produtivas locais absorverem parte das oportunidades que este setor apresenta.

Não somos exceção, não inventamos nada inédito. A Política de Conteúdo Local do P&G no Brasil é apenas a forma que criamos para viabilizar um instrumento central para o desenvolvimento da estrutura produtiva e que se adapta ao arranjo institucional que aqui temos. Não necessariamente é ruim. Pode ser revista, aprimorada, simplificada, mas não pode perder seu objetivo principal, o de criar condições para que a imensa demanda decorrente do setor de P&G seja, ao menos em parte, absorvida por nossa base produtiva local. Se combinada com outros mecanismos, como, por exemplo, a Cláusula de P&D da ANP, e a uma visão de futuro que incentive o desenvolvimento tecnológico e a atividade de engenharia, ainda melhor. Do contrário, estaremos ignorando o que a Teoria da Complexidade Econômica veio nos lembrar de forma tão cristalina: desenvolver a estrutura produtiva beneficia e impulsiona o desenvolvimento econômico e social. No Brasil, isso passa por aproveitar as oportunidades do setor de Petróleo e Gás e por construir uma Política de Conteúdo Local efetiva, sem qualquer dúvida.

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