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A mobilidade e a cidade

Arquiteto do Departamento de Mobilidade Urbana do BNDES e integrante do grupo Idealab Bicicletas do Desenvolvimento

Vínculo 1313 – Cidades são estruturas fascinantes. Podem ser ao mesmo tempo amadas e odiadas. No imaginário comum, o conceito de qualidade de vida é algo muito parecido com o oposto do modo de vida urbano. Mas curiosamente alguns dos lugares mais apreciados do mundo são justamente cidades, para onde turistas viajam durante seu precioso tempo de férias apenas para vivenciá-las. Sua escala e densidade, que podem amplificar a criminalidade e os congestionamentos, também são responsáveis por criar um ambiente vibrante, que promove encontros, negócios e ideias. As cidades são a força propulsora da economia mundial. Segundo Edward Glaeser, professor de economia em Harvard, elas tornam os indivíduos mais ricos, inteligentes, saudáveis e felizes.

As cidades existem para aproximar pessoas e facilitar trocas, logo seu sucesso também depende das condições de mobilidade que ela oferece. Por isso, é necessário rever o papel do automóvel particular, uma invenção formidável feita para proporcionar liberdade de movimento que, mal-empregada, tem causado engarrafamentos, acidentes, barulho e poluição. A União Internacional dos Transportes Públicos apresenta números nada favoráveis ao carro em comparação com as demais modalidades. Para se ter uma ideia do valioso espaço que ele consome, basta imaginar que para transportar 50.000 passageiros por hora, uma linha de metrô precisa ter nove metros de largura, uma linha de ônibus precisa de 35 metros, enquanto uma rua para carros exigirá 175 metros. De largura! Isso sem contar que o automóvel particular desperdiça em média 95% do tempo estacionado. Com 1 kep (kg equivalente de petróleo) de energia, uma pessoa consegue percorrer 48 km de metrô, 39 km de ônibus ou 18 km de automóvel. Dependendo da emissão levada em consideração, o carro é de 3 a 10 vezes mais poluente que o transporte público. As cidades com boas redes de transporte público apresentam metade dos acidentes de trânsito das cidades onde quase todas as viagens são feitas de automóvel. Mesmo nos países desenvolvidos, 25% das famílias não possuem automóvel, e 50% dos proprietários de carro não o têm disponível a qualquer hora que necessitem. Nas cidades onde metade das viagens é feita a pé, de bicicleta ou por transporte público, o custo global das viagens urbanas chega a 7% do PIB. Nas cidades moldadas para o carro, o custo pode chegar a 15%. Da maneira como o utilizamos, o automóvel acabou se mostrando um invento caro, poluidor, letal, iníquo e ineficiente.

Apesar de tudo isso – convenhamos – os automóveis têm suas vantagens. Costumam ser mais confortáveis, seguros e convenientes, o que faz deles uma escolha quase imbatível. Principalmente porque seus efeitos danosos impactam mais quem está fora do carro. A hostilidade do ambiente urbano nos empurra para dentro do automóvel, o que gera um ambiente ainda mais hostil. Romper esse círculo vicioso passa pela recuperação da dimensão humana nas cidades, hoje tão negligenciada. A solução para reativar a interação social no espaço público naturalmente oposta ao carro é o transporte a pé ou por bicicleta. Os bairros desenhados para caminhar e pedalar desaceleram o trânsito e convidam as pessoas não só para circular, mas para permanecer na rua. O pequeno comércio então se reaviva, mais pessoas se juntam, a cidade se democratiza, o convívio se intensifica, a sociedade se torna mais tolerante. Enfim, humaniza-se.

Em julho, o Rio abrigou o Velo-city 2018, principal conferência mundial sobre a bicicleta como modo de transporte, no qual foram relatadas histórias assim. São cidades do mundo inteiro dependentes do automóvel, que, por razões distintas, decidiram ser mais seguras, confortáveis e convenientes aos pedestres e às bicicletas. Copenhagen, referência da ciclomobilidade, também já foi saturada de automóveis. Nos anos 70, diante de grave crise econômica e alto preço do petróleo, seus habitantes reivindicaram a cidade de volta. Hoje, o número de ciclistas entrando e saindo da zona central na hora de pico é superior ao de carros e crescente. Na virada dos anos 80 para 90, a população de San Francisco demandou que o viaduto danificado após um terremoto desse lugar a intervenções de revitalização do bairro histórico do Embarcadero, hoje importante polo econômico com confortáveis calçadas e travessias de pedestres. Nos anos 2000, Nova York demonstrou como seu ambicioso programa de implantação de espaços públicos sem carros foi capaz de mudar a cara da Times Square e outros locais da cidade. Recentemente no BNDES recebemos o ministro de Mobilidade e Obras Públicas de Bruxelas, que nos mostrou a inspiradora transformação em curso na cidade. Em comum, os depoimentos revelam que, independente da época, todos enfrentaram muita resistência e que, após o sucesso, os adversários passaram a apoiar o processo. Ao que tudo indica, o caminho pela humanização das cidades é irreversível. A questão não é saber se as cidades brasileiras vão seguir esse movimento, mas quando. E o BNDES, no seu propósito de “Transformar a vida de gerações de brasileiros, promovendo desenvolvimento sustentável”, tem a chance de impulsionar a construção dessa mudança.

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