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Apagão no Amapá – Memórias de Viagens

Israel Blajberg – Aposentado, antigo integrante da CIPA/BNDES

Vínculo 1416 – As notícias do inesperado apagão amazônico trazem de volta antigas memórias do tempo que a Amazônia vivia à meia-luz, ou à luz de velas… As UHEs de Tucuruí, Samuel, Balbina, Coaracy Nunes, o Sistema Interligado Nacional, a LT 500 kv Tucuruí-Macapá-Manaus ainda eram sonhos distantes… As equipes do BNDES andavam pela região, tentando viabilizar projetos que não saíam do papel por falta de energia. Resultado: a Região Norte era a menor demandante de recursos do Banco, coisa que paradoxalmente ainda hoje acontece, com a agravante das queimadas ameaçadoras.  

Já faz 30, 40 anos. Zé Benedino ainda estava na ativa. Sempre que viajava a serviço do Banco, recordava os velhos tempos, que mesmo àquela altura já eram velhos…  Sentado na última fileira, corredor, fechava os olhos e mentalmente reconstituía como em épocas passadas fez parte da equipe que viabilizou inúmeros avais em nome do Tesouro Nacional para que as companhias aéreas pudessem renovar suas frotas, além de PROCAPs para construir o grande hangar do Galeão e outras instalações, como a cozinha de bordo, o simulador. 

“… confirme que Papa Tango Mike Hotel Sierra tem permissão para decolar…”. A voz nervosa do piloto ecoa pela cabine envolta em fiberglass transparente, protegendo o pequeno Seneca de quatro lugares. 

Retornando da Usina de Serra da Mesa em Goiás, o Grupo de Análise vê cada vez mais perto o Boeing se aproximando da cabeceira da pista, enquanto o Seneca nem pensa duas vezes, arremetendo com força total dos motores a hélice, deixando para trás o Boeing, que vem aterrissando como um tubarão perseguindo um peixinho. 

A torre de Goiânia teria sido bastante otimista nas margens de segurança, mas embora por pouco, tudo acabou bem… e hoje Serra da Mesa ajuda a alimentar Brasília com seus quilowatts-hora, ao mesmo tempo em que foram preservados os últimos membros da tribo dos Avá-canoeiros… 

A partida do Rio foi numa data inesquecível: 15 de março de 1990. Ao chegar a Minuaçu, o GA recebeu a notícia do bloqueio das contas bancárias. Graças ao Collor, estávamos reduzidos ao dinheiro trazido no bolso… e no fim do mundo. 

Muitas viagens, mais reminiscências. Zé Benedino recorda a viagem a Rondônia. Projetos de estradas, armazenamento por todo o estado. Teriam prometido que o avião do governador nos levaria. Era um imponente avião executivo, média capacidade, a jato. Já estávamos nos dirigindo a ele, quando os assessores indicaram: “… não é esse não, o governador vai usar o avião hoje; vamos com aquele ali”. 

Era pouco mais que um teco-teco. Monomotor, pelo menos tinha cabine fechada. Apenas por precaução, voava seguindo as estradas. Foram algumas horas de Porto Velho a Cruzeiro do Sul, incluindo um sobrevoo da pista de Ariquemes balançando as asas, para que a partida fosse interrompida no campo situado no meio da pista, e o avião pudesse aterrisar. 

Na volta, uma tempestade tropical reduziu a visibilidade a zero. Ouviam-se diálogos entre diversos aviões perdidos no meio da chuva procurando a pista de Porto Velho. Naquela época ainda não havia o SIVAM, e o único radar da Amazônia encontrava-se em Manaus, a 2 mil km de distância, onde também estava baseado o único helicóptero a operar na Amazônia. Pouco tempo antes, havíamos recebido a infausta notícia da queda do jato da Eletronorte, com vários diretores a bordo. Lamentavelmente, não havia conseguido encontrar o aeroporto em uma situação semelhante, ainda que tivessem sido feitas fogueiras com barris de óleo para sinalizar a posição da pista. Caiu perto da cabeceira, já sem combustível. Infelizmente não houve sobreviventes. 

Em Porto Velho fomos recebidos por uma lenda viva – Coronel Jorge Teixeira, Teixeirão, governador biônico de Rondônia – no pequeno palácio, junto com o Major Comandante da PM/RO.  Teixeirão fundou o CIGS em Manaus, Centro de Instrução de Guerra na Selva.  

Teixeirão tinha um projeto de importar usinas termoelétricas compactas a óleo para substituir o parque existente, de unidades obsoletas e canibalizadas, que mal atendiam à demanda crescente. Era difícil a importação naqueles tempos da crise do petróleo. 

Até no palácio a luz era mortiça e bruxuleante. Teixeirão reclamava do calor infernal de Porto Velho, onde era proibido ligar o ar-condicionado, lembrando os burocratas que a essa hora em Brasília gozavam das delícias dos gabinetes refrigerados… e as pistas de alta velocidade iluminadas mesmo de dia, enquanto em Rondônia a crise pegava forte. 

Mais alguns anos e a UHE Samuel seria inaugurada, colocando Rondônia de volta ao século XX. O pescado não iria mais estragar, o ar-condicionado poderia ser ligado novamente. Tudo iria melhorar. Ah, se eles soubessem o que estava por vir em 2020.  

As cenas do Amapá na TV ressuscitam antigos fantasmas. Que pelo menos sirvam de alerta para recordar que devemos proteger o meio ambiente, cultivar a sustentabilidade, preservar os biomas. O BNDES tem um papel importante nesse cenário. Que os espíritos protetores da floresta iluminem nossos caminhos e tragam a redenção, a salvação da Amazônia e do bravo Povo Brasileiro, nosso único cliente.   Amém. 

(*) Viveu o Sonho Benedense de 1975 a 2011.

Associação dos
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