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Carta para Professor Luciano Coutinho sobre o Projeto Jano

Paulo Faveret – Economista do BNDES

Vínculo 1410 – Foi com grande alegria que aceitei sua solicitação de conexão no LinkedIn. Como lhe disse em mensagem particular, que agora torno pública, estou preparando minha vida pós-BNDES. Posso me aposentar pelo INSS em abril do ano que vem e há grandes chances de fazê-lo ao longo do ano. Sinto esgotamento de significado no contexto atual e busco novos projetos, que expandam aprendizados adquiridos ao longo desses 28 anos de BNDES. 

Sou imensamente grato a tudo que vivi e aprendi nesse período. Há alguns anos sinto premência de fazer circular conhecimentos que obtive nesse local de trabalho tão privilegiado sob qualquer ângulo que se observe. Na verdade, acho que sempre pratiquei isso, tendo em vista meu gosto por dar aulas e escrever. No período em que estive no RH, esse traço se acentuou e adotei novas metodologias e abordagens, que tento utilizar quando tenho oportunidade.  

Dentre as chances de capacitação oferecidas pelo Banco, uma se destacou – o IMPM (www.impm.org). Graças a seu apoio, Professor, pude participar do “Ciclo 17” junto com três colegas e depois outros dez se juntaram a esse programa que fornece doses maciças de reflexão a gestores normalmente capturados pela ação impensada e pelo curto prazo. O impacto foi tão grande que, junto com outros participantes, organizei e conduzi um programa interno – o Mini IMPM, no qual quase 200 colegas se inscreveram ao longo de cinco turmas. Foi descontinuado, mas sigo trabalhando em desdobramentos.  

Dentre os ensinamentos do IMPM que retive, está a noção de mudança e continuidade. Não há nada de revolucionário na abordagem, sobejamente conhecida por historiadores e filósofos. Ocorre que algumas “teorias” de gestão deliberadamente apagam a dimensão de continuidade em favor de uma visão exclusivamente mudancista e curtoprazista. Pior do que isso, a ação é caracterizada como atributo dos gestores, mas não de todos, pois os subordinados tipicamente são “agidos” pelos detentores do poder.  

Quem pensa dessa maneira perde de vista os múltiplos determinantes sobre trajetórias individuais e coletivas e desenvolve sentimento de “supergestor” ou de “superorganização”. As disfuncionalidades decorrentes não são poucas – a húbris sendo a mais grave e perigosa delas. Ícaro que o diga. 

Diante dessas ideias aqui resumidas e na linha de fazer circular conceitos e histórias, dentro e fora do BNDES, propus a algumas pessoas um conjunto de três iniciativas. Chamei de Projeto Jano. Por meio dessa carta aberta a você, Professor Luciano, dou conhecimento aos demais colegas desse esboço. Para mim, é mais um passo na direção da socialização de conhecimentos. Certamente aprenderei muito. E espero que o documentário, em especial, sirva para dialogar com os críticos das políticas adotadas em período recente, apresentando dimensões deliberadamente apagadas por um discurso reducionista e simplificador. 

Professor, suas sugestões e as de todos os que nos leem serão muito bem-vindas. Espero que tudo fique bem consigo e aproveito para agradecer o convívio respeitoso e construtivo que sempre marcou sua gestão.  

Receba meu abraço afetuoso,  

Paulo  

PS: No que se segue há várias afirmativas, mas todas devem ser tomadas como intenções provocadoras de reações, não como certezas a serem implementadas a ferro e fogo. 

Por que Jano?

Deus romano das mudanças e transições, Jano é associado às portas, portanto às entradas e às saídas. Com face dupla, simboliza o passado e o futuro. É o deus dos inícios, das decisões, das escolhas. 

Tal como Jano, o BNDES olha para o passado e para o futuro, atuando no presente. Não é mérito. É necessidade. Operar o desenvolvimento requer visão da história, das políticas, com suas continuidades e quebras, suas entradas e saídas, seus processos e impactos. 

Queremos resgatar a história do Banco. Não para efeitos apologéticos, mas como instrumento de conhecimento do presente, suas limitações e possibilidades. Para isso, queremos organizar conhecimentos sobre o BNDES por meio de diálogos que evidenciem a riqueza da história de uma organização quase septuagenária. Riqueza nascida de um visceral engajamento com a realidade brasileira. 

Premissas

O trabalho será realizado de forma aberta e interativa. Utilizará métodos de facilitação entre pessoas de diferentes visões. Pessoas e opiniões de dentro e fora do BNDES poderão participar por vários meios – reuniões presenciais, virtuais, rodas de diálogo, comissões, website e outros. 

O consenso é desejável, porém onde não for possível, os distintos pontos de vista serão registrados. O desenvolvimento é processo intrinsecamente complexo e a gestão da complexidade requer ouvir todas as vozes, respeitando e valorizando a diferença como fonte de sabedorias emergentes. 

Frentes de trabalho

O projeto se desenvolverá em duas frentes, ambas tendo como estuário o aniversário de 70 anos do BNDES, ano também do bicentenário da Independência e de eleições federais e estaduais. 

Sem prejuízo do lançamento de produtos e realização de eventos em junho de 2022, haverá produtos e eventos ao longo de 2021 e primeiro semestre de 2022. O segundo semestre de 2020 será dedicado primordialmente à organização dos trabalhos, incluindo meios materiais – sites e outros – e metodológicos – gestão de projetos, escopo, equipes, parcerias etc. 

Passado

Recuperar e defender a história do BNDES é essencial. Queremos contá-la sob a perspectiva de empregados e ex-empregados, incluindo outras vozes, sempre sob o enquadramento histórico-político dos vários contextos em que o Banco atuou. O BNDES e seus constituintes merecem ter voz própria nessa história. 

Há várias questões a decidir, incluindo o período histórico a ser considerado. Deveríamos trabalhar com os 70 anos ou apenas o período mais recente, talvez os últimos 20 anos, quando o Banco passou a ser mais criticado? Podemos ter foco nos últimos 10 anos, recorrendo à história mais remota quando necessário. Decisões a serem tomadas nos próximos meses. 

Um dos produtos dessa primeira frente poderia ser um documentário. A inspiração é ambiciosa, sabemos. Queremos fazer um trabalho que dá protagonismo às pessoas que tiveram suas vidas transformadas pelos investimentos apoiados pelo BNDES – empregados, empresários, profissionais –, ao mesmo tempo em que ouve empregados que participaram dessas operações. 

Algumas das referências podem ser a série People’s Century (BBC/PBS, 1995-1997) ou os trabalhos Hearts and Minds (1974), de Peter Davis; Edifício Master (2002), de Eduardo Coutinho; ou a série A Guerra do Vietnã: Um filme de Ken Burns e Lynn Novick (2017). Esse último, em especial pelo uso que faz dos depoimentos para contar os fatos, ao invés de recorrer a entrevistas com especialistas. 

A obra pode desenvolver-se em três planos intercalados: no primeiro, as pessoas e seus depoimentos; no segundo, as mutações da organização; e no terceiro, a trama do desenvolvimento econômico e as circunvoluções da política. O argumento inicial ainda não foi rascunhado. 

Para viabilizar produção de alto nível estudaremos formas de financiamento coletivo bem como a busca de parcerias. Profissionais do ramo serão contratados para a redação do roteiro e a realização do documentário. Provavelmente seria necessário captar imagens apenas para os depoimentos, uma vez que há extenso material disponível para as camadas históricas. 

Futuro

O segundo bloco consiste numa série de iniciativas para mapear possíveis caminhos adiante no Século XXI e seus desafios. Até 2022 faremos um conjunto de ações com atores relevantes de várias organizações para mapear os requisitos da nova etapa do desenvolvimento brasileiro. Isso inclui a preparação de estudos e a realização de seminários, métodos clássicos. 

Sem prejuízo de produtos ao longo de 2021, o grande objetivo é construir ao menos duas peças de fôlego para o aniversário de 70 anos: um dicionário brasileiro do desenvolvimento e um Green Paper sobre as perspectivas para o desenvolvimento brasileiro.

O dicionário partirá de uma estrutura a ser definida na primeira etapa, incluindo a composição dos verbetes. A escolha dos verbetes é decisiva e consumirá bastante tempo. Ela é que definirá a ambição do projeto. A redação dos verbetes deve ser realizada por vários colaboradores, com objetivo de manter a pluralidade de pontos de vista. Necessário avaliar se os redatores serão apenas empregados do Banco ou se externos serão convidados. 

Green Paper será um documento de posicionamento dos empregados do Banco, por meio de sua Associação, sobre os desafios do desenvolvimento brasileiro e formas de lidar com eles. Na tradição anglo-saxã de elaboração de políticas públicas, o Green Paper é um documento de mapeamento de problemas e propostas, ao qual se segue um White Paper já voltado para a definição de políticas públicas. 

Sua construção será plural e obedecerá ao perímetro definido na primeira etapa, de estruturação. Por plural entenda-se várias vozes, dentro e fora do Banco. Idealmente, haverá um núcleo-duro de temas e conceitos, onde buscaremos maior consenso com base na visão da AFBNDES. Fora do núcleo-duro poderá haver um conjunto de temas menos consensuais e mais cacofônicos, no qual o mapeamento e a classificação de propostas serão mais importantes do que sua hierarquização e seleção. 

Observações

As ideias apresentadas são iniciais. Na etapa de estruturação do projeto, durante o segundo semestre de 2020 e primeiro trimestre de 2021, haverá as definições. Muitos pontos estão em aberto. Preferimos compartilhar a ambição precocemente para recolher o máximo de sugestões e apoios. Há riscos, mas cremos que isso reflete o caráter intrinsecamente coletivo da iniciativa.

Associação dos
Funcionários do BNDES

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