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Taca-Lhe Pau, BNDES

Paulo Moreira Franco – Economista do BNDES

Vínculo 1296 – E eis que o Arthur Koblitz me força, por conta de seu artigo no VÍNCULO, a ler o artigo de Fábio Giambiagi no Estadão. Em geral tento privar minhas retinas tão fatigadas daquilo que colegas falam/publicam no PIG. Valor, Estadão, Globonews – a vantagem de termos internet e Netflix é poder esperar que a lata de lixo da destruição criativa dê cabo dessas instituições cujo papel Chomsky descreve como a doutrinação das elites, coisa para a qual a mediocridade do meu atual Botafogo colabora sensivelmente.

Mas vou lá e leio o artigo do Fábio. E depois, já no escuro das 20:30, leio o do Koblitz. Um, uma peça de propaganda anódina desse governo de sobreviventes ao Golpe, peça que sequer conta com a hilária estupidez dos defensores originais da TLP (se o editor permitir haverá no online um texto que não cheguei a publicar sobre a discussão da TLP no Congresso. Alerto que ele cita Marx: não o recém-bicentenário, mas o bigodudo) de tão correta, insossa e oportunista que é. O outro, uma defesa apaixonada do Banco contra algumas ameaças de longa data ditas e publicadas, mas, a meu ver, meio que irrelevantes. Uma diz vamos em frente, outra diz estão atrás de nós. Ao invés de ficar aqui contrastando os artigos, imaginando o que querem dizer com Taca-Lhe Pau para o BNDES, vou tentar comer essa sopa pelas bordas e botar a discussão em pé.

Ponto inicial, básico: a ideia de que existe subsídio (ou necessidade de subsídio) nas operações do BNDES decorre de um desconhecimento, perdoem-me o termo, completamente arcaico, primário sobre a origem do dinheiro e sua relação com crédito. Que Fábio, apologista da destruição do que resta de estabilidade num mundo degradado pela corrupção ideológica neoliberal que corroeu os valores e compromissos que construíram a sociedade capitalista do pós-guerra discurse nesses termos, faz sentido. Que pessoas do campo progressista aceitem esses termos significa uma forma de rendição, uma forma de normalização do que é a confortável ficção da Matrix ideológica de que nos fala Chomsky. Deixemos de lado essa pílula meio Boca Juniors. Vamos lá, “You take the red pill—you stay in Wonderland, and I show you how deep the rabbit hole goes.”

1. Pra que se acredite que exista subsídio precisa se acreditar que exista uma taxa de juros de mercado verdadeira, que reflita alguma realidade de mercado. Sorry, não existe. Se algum BACEN parar de enxugar liquidez quando necessário (isto é, quase todo o dia, por meio de operações compromissadas em nosso caso) o mecanismo de mercado joga a taxa de juros a zero ou abaixo. Quem tabela a tal taxa de mercado em nome de um mítico combate à inflação é o BACEN.

2. Mas… e a diferença entre o preço que o Tesouro paga (diferentes SELICs entre outras coisas) e o que o BNDES empresta? Bem, largando-se o mito do mercado na primeira parte da equação (rejubilai felizes parasitas do < 1%, devotos nababos do Tesouro Direto, beneficiários da generosidade do BACEN para com seus colegas de classe social e daqueles poucos – mas não tão pouco assim – ainda acima) e prestando-se atenção que a segunda parte (financiar desenvolvimento) atende a um objetivo completamente distinto do primeiro (combate à inflação) … ué, aonde mesmo está o problema? Talvez por isso não se tenha uma Tesla, uma Amazon, um Veyron feito aqui… Bem, o Brasil exportou o Galactus da cerveja para o Mundo, o mesmo Mudo onde a Plataforma de Bezos segue, a todo vapor, queimando capital a nível global, destruindo com o funcionamento de mercados em mais de um sentido da palavra, demandando “incentivos” numa disputa predatória entre cidades na América do Norte… Será que eles cantam “I consider it a challenge before the whole human race” no banheiro?

3. Há que se perceber que a tal da taxa real de juros é uma ficção confortável para economistas fazerem seus modelos e continhas em mundinhos fechados, esféricos e sem atrito. No mundo real a referência é dada pelas opções concretas do que se pode fazer com o dinheiro. Neste sentido, um investidor externo, por exemplo, está preocupado com a inflação brasileira ou com o câmbio? E um investidor nacional com acesso ao mercado global de crédito? Mesmo do ponto de vista de quem esteja preocupado em preservar seu patrimônio ou poder de compra, alguém aqui acha que um índice de inflação de uso genérico realmente reflete isso? Ou trata-se apenas de uma simplificação para facilitar as contas e os discursos dos economistas, uma generalização útil, mas que não funciona em um monte de situações que interessam a alguém que detém, investe em, ou, como no caso do BNDES, financia capital?

4. Será que não cai a ficha que a tal da TLP nada mais é que uma taxa prefixada somada a uma correção pela inflação passada? Que se até o Plano Real essa taxa por décadas foi fixa em 6% – agora querem fazer essa taxa, prefixando-a no momento da contratação, variar entre esses momentos e nada mais que isso? Será que não cai a ficha de que substituir a TJLP, uma taxa que pode ser arbitrariamente definida por COPOM, CMN, Fazenda, seja lá a quem couber fazê-lo, por correção automática pela inflação passada, quer dizer que não se acredita na responsabilidade desse agente econômico que a fixa? A volta da correção monetária não quer dizer que todo o edifício teórico de Lara e Pérsio não passou de uma enorme e transitória bobagem, e que a reindexação é a única forma de se dar com o futuro distante nesta terra de Pindorama (Epa, eles já fizeram isso antes nas mamatas de concessões de serviços públicos, com correção pelo IGP-M, por exemplo. Ah, a sabedoria do Mercado…).

5. Fora das fronteiras da Folha Universal que é o PIG discutindo economia existe um Mundo. Vocês estão cientes de que o Banco Central Europeu, além de comprar dívida pública no mercado secundário para baixar os juros, compra também bonds corporativos? E que isso é elemento fundamental da competitividade das empresas europeias que se preparam para disputar o controle da Eletropaulo, por exemplo? Vocês se dão conta de que a privatização da Eletrobrás é provavelmente estatização para algum governo estrangeiro, provavelmente o chinês – China onde a explosão do crédito vai além do que possamos imaginar?

6. Alguém quer discutir à sério um mundo com Made in China 2025? Alguém acha que à luz da reflexão estratégica na qual estamos envolvidos, da nossa Visão 2035: Brasil, um país desenvolvido, estamos dando uma resposta competitiva a isso?

Essa é a realidade concreta contra a qual a indústria brasileira luta e não o catecismo do mercado que inspira os discursos dos apologistas dos bancos paulistas e dos tamboretes do Leblon. A realidade que pôs FIESP, ABIMAQ, ABIQUIM etc. reclamando, ao lado da AFBNDES, quando da discussão da medida provisória da Taca-Lhe Pau. Amigos próximos em ambos os lados do debate é uma insinuação de simetria que de fato nada revela. A menos nas linhas traçadas no papel, os lados nunca são só dois. Amigos: sempre um grupo restrito, filtrado, e embora por vezes separado, próximo ao muro onde se está empoleirado.

Estivesse Fábio preocupado com o futuro não tão distante assim o desespero seria com o aquecimento global (como para Sérgio Besserman, por exemplo) – e não com aposentadoria. Mas discutir aposentadoria atende à agenda de destruição do Estado e à glorificação da pilhagem do país pelo setor financeiro. Estivesse interessado no tal do crescimento que alardeia vir por aí, estaria correndo para discutir a crise cambial que afeta nosso maior vizinho (¿crise Macri-economica?), como isso pode nos impactar, que medidas de segurança precisamos tomar a respeito – não preocupado com quem pretende, trocado este governo impopular de caras muito vivos que sobreviveram no Golpe, substituir a TLP por algo menos rígido e mais adequado à execução de uma política econômica. Mas, como respeitoso ocupante de função do Governo dos que sobrevieram com o Golpe, escreve o que pode sair no jornal.

Não são os jornais e seu conjunto cada vez menor de leitores quem irá decidir o que será o futuro da TJLP/TLP. São as eleições, é um próximo governo que, honestamente, não creio que alguém faça a menor ideia do que será. A questão, colegas, não é estar pronto para defender em 2019 esse tosco e apressadamente desesperado conjunto de planos e medidas fabricados hoje, dentro e fora, no âmbito das diferentes gestões do Golpe, por diferentes burocracias sem nenhuma subordinação ao Voto, das quais a TLP e a devolução são as mais significativas para nosso trabalho cotidiano. A questão é, ainda neste ano, produzir algum resultado, algo de positivo que não seja mero papel, algo que o presidente Temer possa mostrar com orgulho se candidato, um mínimo de respeito que devemos a quem se deve um mínimo de respeito.

E, nesse sentido, nas palestras que tem feito para diferentes áreas do Banco, ao defender que a TLP com o redutor que existe este ano é um ótimo negócio a ser vendido aos que pensarem em acrescentar uma obrigação para com o BNDES em seu passivo, Fábio tem toda a razão. 2018 acontece agora, uns poucos meses que restam. Não creio que mais do que isso, mas é a realidade na qual devemos operar. A TLP é o que temos, e ela está longe de ser ruim neste momento. Mas “amanhã há de ser outro dia”.

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